Como o corpo humano se decompõe?

É um filme de terror de arrepiar os cabelos de qualquer defunto. Depois
que a gente passa desta para melhor, nosso corpo perde suas defesas e
começa a ser atacado por todos os lados: bactérias, animais e até
substâncias produzidas por nós mesmos dão início ao fim. O cadáver vai
ficando escuro e inchado, a pele e os órgãos se desfazem e o cérebro
vira um caldo. Depois de algum tempo, não sobra quase nada. A
decomposição acontece em duas frentes. A primeira é a mais esquisita: o
próprio corpo se decompõe. "Quando alguém morre, a oxigenação pára de
acontecer e o organismo se desequilibra. Minerais como o sódio e o
potássio, importantes para o metabolismo, deixam de ser produzidos. Com
isso, as células se desestabilizam e passam a digerir o próprio corpo",
diz o fisiologista e professor de medicina legal Marco Aurélio
Guimarães, da Universidade de São Paulo (USP). Ao mesmo tempo, bactérias
famintas também entram no banquete. As primeiras a avançarem na carne
são as da flora intestinal e da mucosa respiratória, que já vivem no
organismo. Para continuarem vivas, essas bactérias invadem os tecidos e
os devoram. Depois disso, as bactérias do ambiente deixam o cadáver
irreconhecível. O suculento resto fica para insetos e até cães, gatos e
urubus. Em geral, um corpo sepultado leva de um a dois anos para se
decompor totalmente, mas esse tempo pode variar dependendo das condições
do ambiente e do cadáver - se o morto tomava antibiótico, por exemplo, o
processo demora bem mais. No fim, sobram apenas ossos e dentes, que
duram milhares de anos a mais que os outros órgãos. Eles são a principal
pista para que peritos consigam solucionar mortes violentas.
Vida de morto Cadáver vira banquete para bichos e bactérias até ficar só o osso
SUCO PÓSTUMO
A pele passa por uma transformação radical: primeiro, ela perde água e
resseca, tornando-se amarela e enrugada. Com o ataque das bactérias, ela
fica verde e se dilata. Depois aparecem as bolhas. Quando elas se
rompem, é a maior nojeira: a pele começa a soltar líquidos e, por fim,
se desmancha
DURO NA QUEDA
O cadáver começa a ficar duro algumas horas depois da morte por causa
do acúmulo de cálcio nos músculos. O corpo do morto se contrai e fica
com pernas e braços meio dobrados. Para esticá-los, basta dar um puxão —
a história de que é preciso quebrar os ossos do morto para deixá-lo
reto não passa de lenda
RESISTÊNCIA MILENAR
No fim da decomposição sobram apenas os ossos e os dentes do cadáver. O
segredo é que eles são formados basicamente por minerais, enquanto as
bactérias decompositoras se interessam apenas por matéria orgânica. Se o
defunto for enterrado em condições normais, longe da umidade e do calor
excessivo, esses órgãos podem durar milhares de anos
EREÇÃO EXPLOSIVA
Como a pele da região do pênis é mais frouxa que a de outras partes do
corpo, os gases bacterianos se infiltram por ali com mais facilidade.
Como resultado, o dito-cujo tem uma falsa ereção. Mas isso não significa
que o defunto está animadinho: ele apenas se esticou com a descarga
gasosa
PERFUME DE PRESUNTO
Durante a decomposição, as bactérias que consomem o corpo fabricam
subprodutos com um odor nada agradável. Substâncias como a putrescina e a
cadaverina (credo!) ajudam o corpo a cheirar tão mal. Mas o campeão do
fedor é o gás sulfídrico, que, além de tudo, é inflamável
NU COM A MÃO NO BOLSO
Como diz aquela marchinha do Silvio Santos, "do mundo não se leva nada"
— nem mesmo as roupas do funeral, que também são uma iguaria muito
apreciada pelas bactérias. O algodão e outras fibras naturais vão embora
mais rápido, em três ou quatro anos. Já tecidos sintéticos, como náilon
e poliéster e outros derivados do plástico, podem durar décadas
VISTA EMBAÇADA
Como os outros órgãos, os olhos dos mortos também se desidratam. A
córnea fica com uma espécie de tela viscosa meio esbranquiçada, parecida
com um véu. Mais adiante, quando as bactérias e larvas começam a atuar,
os olhos são o prato predileto. Por isso, eles são corroídos rapidinho
até sumirem totalmente
MINGAU DE CÉREBRO
As células cerebrais apagam entre 3 e 7 minutos após a morte. Dias
depois, quando os gases da decomposição invadem os órgãos, os tecidos do
cérebro começam a se desmanchar. A partir daí, a massa cinzenta vai se
tornando um líquido viscoso com a consistência de um mingau de cor de
argila, que pode escorrer pelas narinas
SANGUE FRIO
Assim que o sangue pára de circular, ele perde oxigênio e fica mais
escuro. Em 8 a 12 horas, ele começa a coagular, ficando com a
consistência de uma goiabada. No fim, por ação da gravidade, o sangue
concentra-se na parte de baixo do corpo, em regiões como as costas,
pernas e pés
CRESCIMENTO DO ALÉM
Já ouviu aquele papo de que cabelos, pêlos e unhas crescem depois da
morte? É verdade! Eles são feitos de queratina, uma proteína muito
resistente. No caso de cabelos e pêlos, a estrutura onde os fios se
desenvolvem nem percebe que a irrigação sanguínea acabou. Mas isso só
dura 24 horas, quando os fios podem crescer no máximo 0,05 centímetro
DESTRUIÇÃO INTERNA
Pela ação das bactérias, os órgãos desprendem-se da estrutura do corpo e
desmancham. Os que se decompõem mais rápido são os pulmões (que têm
tecidos finos), os intestinos (que já possuem bactérias que ajudam na
digestão) e o pâncreas (cujas enzimas agem na decomposição). Um dos que
mais demoram é o fígado, pois ele é um dos maiores órgãos do corpo
humano
Consultoria: Faculdade de Medicina do ABC